terça-feira, 28 de novembro de 2017

Depois do furacão II



Li um texto há algum tempo, que dizia que todo mundo devia passar por um furacão, fazendo alusão ao caos do furacão Irma nos Estados Unidos e América Central. O texto dizia que "todo mundo devia passar por um furacão para, por fim, amanhecer em gratidão com o primeiro raio de sol, com um pato que invade o seu quintal, ou com o canto daquele passarinho que, por algum dos muitos milagres da natureza, também sobreviveu". Acho que esse furacão não é apenas literal. Não é só quando tem vento que queima, que manda casas, carros, animais, para os ares e destrói cidades inteiras com sua fúria. Há os outros furacões, tão intensos quanto, mas que passam por dentro da gente. Às vezes até tem um fato bem concreto que acontece e tira a vida da órbita, mexe com os eixos; mas nem sempre. Às vezes só dá um rodopio na cabeça mesmo. Faz um nó na vida da gente. O meu furacão foi esse ano. Um cara passou na minha frente achou que podia me matar para levar o meu celular. E foi o que ele tentou fazer, mas não conseguiu. Eu não morri. Fiquei lá, na calçada na frente da minha casa, sufocando no meu sangue, sob os gritos das minhas vizinhas. Me deixou com 20 dias de CTI e hospital. Me deixou com um monte de cortes no peito e no tórax. Me deixou com dor, e com morfina para passar a dor. Me deixou com o grito preso na garganta, porque por mais de três meses eu não consegui sentir nada sobre isso. Eu tinha uma dor bem intensa para cuidar. Me deixou com medo de todo mundo e da vida. Me deixou uma família assustada que, na tentativa de me proteger, me sufoca. Me deixou uma mudança forçada, que eu escolhe sem muito consentimento. Me deixou com dúvida. Me deixou com as consequências de não poder fazer nada sozinha por um tempo. Hoje me deixa também com raiva. Às vezes. Bem grande e intensa. Outras vezes é só tristeza. Tristeza pelas consequências que deixou, pelas marcas desse corpo que restou. Por meses eu me olhava no espelho sem olhar. Eu fazia curativos sem ver nada além das porções de cortes que eu precisava ver para cuidar, limpar, fechar. Porém faz um tempo que tenho me obrigado a olhar pelas primeiras vezes para meu corpo de inteiro, com tudo que significou: as cicatrizes, as medidas extras, o peso além do desejado, as celulites, a flacidez. Tudo isso que veio depois do furacão. Não é na hora que a gente sente os efeitos, sabe? Na hora é só uma loucura. Depois que o furacão passa, e que a gente precisa tirar os entulhos, limpar a casa, suturar as rachaduras; é nessa hora que a gente se dá conta do que é que se complicou.





terça-feira, 21 de novembro de 2017

Versos simples

Minha frase preferida sobre a força que o teatro exerce sobre mim é de Brecht. “Minha arte é meu sintoma”. É muito minha, porque soma vários elementos que compõem as minhas escolhas em apenas 5 palavras. Simples, direta, concisa. Tanto significado em meia linha escrita. E eu própria sou muito da escrita. Não me veio profissionalmente, porque dentre as ocupações, o corpo falou mais alto, sem a delicadeza da letra corrida que escorrega sobre o papel. Mas a escrita veio, principalmente para dar sentido à dor. Se os desenhos transformam a tristeza em poesia, a escrita transforma a dor em significante, cria significados.

Aprendi com o tempo a me escrever por meio de simples versos e complexos sonetos. Também comecei a me escrever nos longos textos, nos cadernos com os rabiscos, os rascunhos que ficam pelo blog. Em cada linha um mundo de sentimentos. Todos os meus sentidos.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

A vida em montanha-russa

A vida virou uma imensa montanha russa de sentimentos. Primeiro pensei que uma boa metáfora fosse a roda gigante, mas a roda gigante é cíclica, anda por toda a vida pelo mesmos caminhos, embora encontre sempre seus altos e baixos. Montanha russa tem me representado melhor. É essa coisa que eu sinto que tem saído do lugar, sim, tem seguido adiante, caminhado em frente, com tanta luta e tanto aprendizado, mas que ao mesmo tempo tem seus altos e baixos. A vida virou essa inconstância, esse desejo pelo afastamento e pelo silêncio, pela solidão. Virou esse jogo de sombras, por meio do qual se consegue prêmios apenas depois de muitos erros e acertos, às vezes mais erros que acertos e mais do que a gente acha que pode suportar.