quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Um ou dois dias de calmaria


Descolorindo o dia. Pintando e repintando as estrelas do muro. Formando bolhas de sabão com as quedas do chafariz. Um nariz de palhaço e dois ou três sorrisos soltos na praça. Uma vida. Dois dias e meio de gargalhadas. Tristeza em alguns momentos. Triste esteve em dois ou três momentos. Agora é canção e poesia. Agora é beijos e abraços apertados. Segredos revelados. Sonhos recontados.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Sob névoas e tempestades

Então corte, recorte. Corte o tempo em fatias infinitamente menores, tire os ponteiros do relógio e acabe. Acabe com tudo. Destrua as folhas das árvores em seu outono frustrado. Grite, braveje e entenderei. Todos entenderão que o tempo precisa de tempo também e que nem sempre o que se quer mostrar é de fato o que se vê, que as coisas podem encobrir-se em palavras bonitas ou que lágrimas secam sob a potência de um falso sorriso. Mas se ela disse que estava bem era porque queria dizer. E por mais que as palavras lhe pesassem, não faltavam motivos para falar. Para doer com lágrimas de chocolate e suspiros de morango. Tudo, tudo, desmoronando, caindo. E a vida triunfando sob névoas e tempestades.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Uma taça de vinho seco

Bebendo do mesmo vinho todas as noites, engolindo os mesmos goles gelados e secos como se fossem água mineral sem gás. Mais uma noite em que palavras me embriagam, em que desejos me deixam tonta e derrubam, de rosto, sobre o piso frio. E ali, deitada, permaneço observando ao fim do mundo, aos sonhos desejantes explodindo como estrelas cadentes em decomposição no ar. Como se não houvesse acordado, como se nunca houvesse dormindo, como se jamais tivesse desejado um fio de vida escorrendo pela ponta dos dedos da mão.

domingo, 19 de agosto de 2012

O dia de ontem

Então eu te disse que me doíam essas esperas, esses chamados que não vinham e quando vinham sempre e nunca traziam nem a palavra e às vezes nem a pessoa exatas. E que eu me recriminava por estar sempre esperando que nada fosse como eu esperava, ainda que soubesse.

- Caio Fernando Abreu, in O dia de ontem.

Desenhos de dor

Em dias assim, em que palavras são mais do que palavras, em que se quer esquecer o que não quer ser lembrado. Prepotência em ser invencível e incansável quando o corpo pede trégua da longa jornada. Há uma voz sedenta que de dentro de mim suspira sussurros de dor, de imaginação. Há uma culpa que culpa a culpa de outro, mas que cobra a voracidade da verdade. A verdade relativa de um eu inconsciente e incontido, de um nós expandido e fora de controle. Não desejara ser som, queria ser pó, poeira cósmica translúcida pelo Universo.

sábado, 4 de agosto de 2012

Dias de sol

Ainda que me cortassem meus cabelos e destruíssem minha face com pontas de facas, ainda que o Amor me cobrasse pelo mau uso e serena eu dormisse com as mãos encostadas na terra úmida da noite, ainda assim saberia esquecer. Ainda assim poderia e gostaria de dizer que o destino se apressa em chegar, mas que não seria capaz de desbotar o azul do céu. Muitas outras vozes partiam como águas turvas por um rio desaguando no infinito, um rio escuro e fétido, com peixes mortos e apodrecidos na margem de correnteza leve. Desaguava como restos de solidão procurando vaga no porto, como touro valente cego pela areia.