sexta-feira, 24 de julho de 2015

Quando livros dizem por você, o que você não é capaz de dizer

Enquanto voltava para casa, lembrou-se dos dias que se seguiram ao funeral, quando o silêncio da casa se tornou tão palpável (...). Até que certa manhã ela começou a sentir um alívio da dor, como se finalmente começasse a reduzir a pressão, diminuindo seu poder de ferir. Naquele mesmo dia, Rachel não conseguiu recordar para que lado o pai repartia o cabelo, e entendeu mais uma vez o que já tinha aprendido aos cinco anos, quando a mãe fora embora: o que torna suportável a perda de alguém amado não são as lembranças, mas o esquecimento. Primeiro esquecia-se das pequenas coisas - o aroma do sabonete com o qual a mãe se lavava no banho, a cor do vestido que ela usava para ir à igreja - , depois de algum tempo, o som de sua voz, a cor do cabelo. Rachel ficou impressionada com o quanto podia esquecer, e tudo que esquecia tornava aquela pessoa menos viva dentro de si, até ser capaz de finalmente suportar a dor. Com o tempo, era possível se permitir lembrar, até desejar lembrar. Mas, mesmo assim, a sensação daqueles primeiros dias podia voltar para lembrar-lhe que a dor continuava ali, como um velho arame farpado escondido no cerne de uma árvore.

- Ron Rash, in Serena, p. 53.

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