sábado, 31 de outubro de 2015

Essa paz que eu preciso....


Teria paz se não tivesse sangue
Se o coração não conseguisse trabalhar
Esqueceria tudo do começo
E viveria toda a vida sem pensar

Não tomaria tantos comprimidos
Apagaria o que me dessem pra fumar
Talvez tudo fizesse algum sentido
Talvez o que é sentido possa se apagar
Apaga do teu coração
As marcas de um tempo atrás
E saiba que eu não sei viver
Com o estrago que o tempo faz


Eu tento me esconder em mar aberto
E ter por perto quem me abraça sem cobrar
Os comprimidos não me compreendem
E não esqueça o que paguei para apagar
Queria estar no teu lugar agora
Só pra entender como é estar no meu lugar
Queria estar no teu lugar agora
Só pra entender como é me ver de fora

Me diga que não quer sair
Que tem a chave para entrar
Que resolveu a equação
E sabe como me tirar do fundo
E sabe como me salvar do mundo

Aunque puedo caminar, correr y volar, no me muevo
Todo lo que eres para mi, elimina la adaga en mi corazón
Y saca la muerte de mi vida.

Teria paz se não tivesse sangue
Se o coração não conseguisse trabalhar

- Esteban, in Janeiro

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

E que palavra é essa que a vida não alcança?

Mas era apenas isso,
era isso, mais nada?
Era só a batida
numa porta fechada?

E ninguém respondendo,
nenhum gesto de abrir:
era, sem fechadura,
uma chave perdida?

Isso, ou menos que isso
uma noção de porta,
o projeto de abri-la
sem haver outro lado?

O projeto de escuta
à procura de som?
O responder que oferta
o dom de uma recusa?

Como viver o mundo
em termos de esperança?
E que palavra é essa
que a vida não alcança?

- Carlos Drummond de Andrade, in 'As Impurezas do Branco'