terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Pontinhos de luz na tempestade

Ontem fui à nutricionista novamente, morrendo de vergonha da catástrofe que foi minha semana, dos excessos, das faltas, dos vômitos forçados, dos chocolates descontados. E claro que uma das primeiras foi a maldita pergunta, que na verdade é uma informação "vamos pesar?!" e a resposta, ok, mas eu não quero saber. No entanto, ela disse que meu resultado tinha sido excelente (menos 2 kg). Aí eu quis saber, porque precisava de alguma notícia boa em meio a um dia ruim de uma semana péssima. Até chorar eu chorei, contanto da fatalidade do final de semana, dizendo que estava me sentindo arrasada, que não estava bem mesmo. Mas ela foi uma querida, acolheu e trocou de assunto, talvez por não querer mexer onde não daria conta, o que foi muito sensato de sua parte, e ainda assim sem perder a sensibilidade ou me deixar sem retorno. Foi ela quem perguntou se eu havia vomitado em meio a isso tudo e eu não disse que não, jurei para mim mesma que seria honesta, e ela sorriu e disse "ok, mas você sabe que isto te faz mal, não sabe? E não deixe de me dizer se acontecer, tudo bem?". Sim, eu prometi e jurei que tentaria e que já estava tentando. Vai ficar tudo bem!

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Para dizer adeus

Me peguei dizendo que a vida é muito injusta. E disse isto porque você se foi. Na tarde de hoje, nosso Giuliano se foi, e digo “nosso”, porque você era de todo mundo, querido por todo mundo. Você que tinha esse jeitinho deliciado todo seu de dizer “querida, tira esse vestido e taca fogo, por favor!”, ou seu riso engraçado de no alto do seu 1m90 dizer que está tão gordo que está saindo sangue do nariz de tão apertada que está a sua calça jeans, você que tinha um jeitinho irônico e nada leviano de brincar com as “sacanagens” que dizia ter feito com seus alunos. Mas talvez meu caro, e só talvez, a vida não tenha sido injusta contigo, embora tenha sido curta, e só tu saibas a dimensão disto. Eu sei que digo isso agora porque estou zangada e queria que você estivesse conosco para terminar os artigos do projeto no ano que vem, porque queria ter toda essa sua simpatia bailando pelo salão de meu baile de formatura, porque queria mais uma vez ser convidada a fazer fragmentos célebres de dramaturgos em suas aulas, porque queria que você terminasse a brilhante tese do doutorado. Porque eu queria poder te contar que fui aprovada no mestrado, dizer isso para você que torcia por mim! Eu sei que nunca mais conseguirei ler Zizek da mesma forma depois deste dia e é incrível que no mesmo momento em que recebi a notícia da sua morte estivesse com “Como ler Lacan” aberto na tela do meu computador, lembrando daquela aula fantástica na disciplina de Lacan neste ano. Por que não poderemos trocar figurinhas sobre materialismo dialético enquanto estiver escrevendo minha dissertação? O que eu faço com teu nome na lista de convidados do meu baile de formatura?
Ou talvez essas lágrimas sejam porque eu me dei conta só agora, e me pergunto como seria se fosse comigo, de que a vida é frágil. De que nosso corpo é uma taça de vidro fino, é um nada frágil, fraco, quebrável. E que a gente sequer pode escolher ficar mais um pouco. Lembro que quando vi a notícia de duas meninas que morreram no dia seguinte à apresentação do TCC, aguardando ansiosas pela formatura, assim como eu, eu brinquei com as pessoas dizendo que se eu morresse eu ia chegar para São Pedro e dizer “ah, não, São Pedro, o senhor faça o favor de me deixar voltar até a minha formatura”! Mas eu sei que não poderia escolher, que não estaria em minhas mãos e que, portanto, eu também não poderia dizer adeus.
É profe, acho que você deixou marcas por aqui que não poderão ser apagadas. E eu espero mesmo, do fundo do meu coração, que você também acredite que a vida foi justa o suficiente contigo, mesmo tendo sido curta. Ou melhor, que ela só tenha sido curta para nós, meu caro. Somente para nós.

domingo, 29 de dezembro de 2013

O inferno são os outros - e nosso céu também

O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço.

 - Marco Polo, in PELBART, Cidade, lugar do possível.

sábado, 28 de dezembro de 2013

Como chuva, que corre



Depois de uma sequência de dias catastróficos, hoje eu consegui comer direito, sem excessos nem vômitos. E como chego à noite me sentindo bem! Me pesei hoje, na farmácia... Eu sei que não deveria fazer isto, mas fiz e sei que os resultados só não foram piores porque eu vomitei três, quatro vezes ao dia. Mas não quero mais isto! Sei que não quero continuar nesses ciclos intermináveis de comer-vomitar e no dia seguinte sentir enjoo, cansaço, dores abdominais. Não quero e não quero! Como é ruim saber que eu amo correr, ver pular na minha cabeça que quero correr uma hora e vinte minutos, para compensar as extravagâncias, e quase morrer com 40 minutos. Já hoje, eu caminhei um monte, fiz zilhões de coisas, mas podia correr até o fim do mundo! É isso que eu quero, é em prol disto que estou lutando, é isto que eu quero ser. É isto que VOU SER, que sou.

sábado, 21 de dezembro de 2013

Novos ventos

Dei uma sumida!
Pois bem... A faculdade acabou, mudei de cidade e voltei a morar na cidade e na casa dos meus pais, precisei amontoar as poucas roupas que sobraram em uma cômoda minúscula, junto com as fotografias dos colegas da graduação, ganhei um peixe e arrumei um emprego. Ah, e sim! Fui à nutricionista!
A primeira impressão foi confusa... Eu havia vomitado nas duas noites anteriores à ida à consulta e realmente havia exagerado no jantar. Comi bolinhos fritos em ambos os dias. Não deu outra! Pesei 64,1 Kg na balança dela (com roupa, a tarde) e fiquei decepcionadíssima! Eu engordei! Claro que isto abriria mil e uma maluquices na minha cabeça... Minha mãe forçando a barra de um lado e a nutricionista do outro dizendo que eu estou quatro quilos acima do meu peso ideal?! Foi motivo suficiente para eu fechar a boca e não comer por três dias seguidos. Mas usei do bom senso. Peguei a folha impressa com minha prescrição e disse a mim mesma, "ok! Eu posso fazer isto!". E foi o que fiz. Mesmo achando ela maluca por querer emagrecer 4 quilos e precisar comer muito mais do que eu estava acostumada a comer. Mas fui ao mercado e comprei todas aquelas prescrições: castanha do pará, gengibre, trigo em grão, grão de bico, azeite de oliva, proteína de soja, frutas, legumes. Não mudou muito o conteúdo, mas a forma de comer sim! São umas sete refeições ao dia e estou conseguindo fazer pelo menos umas cinco, já que o trabalho dificulta um pouco minha disponibilidade de tempo, mas estou encarando... Essas balanças de farmácia não são muito confiáveis, mas hoje pela manhã pesei 60,1 Kg, ou seja, 4 quilos a menos que três dias atrás. Porém hoje tive muita vontade de doce e comi duas colheradas de leite condensado do chocolate do meu irmão. Cuspi a terceira antes de engolir. Ontem também fiz isso com o risoto da minha mãe. Minha meta para os próximos 10 dias, já que a próxima consulta é dia 30, é de comer conforme a listinha, mesmo tendo o Natal aí no meio, e não vomitar nenhuma vez. Bora tentar?!

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Sobre os segredos da vida

- (...) Não tem nada de nada aqui.Marina me deu uma olhada que não consegui decifrar. - Está enganado. Aqui estão as lembranças de centenas de pessoas, suas vidas, seus sentimentos, suas ilusões, sua ausência, os sonhos que nunca conseguiram realizar, as decepções, os enganos e os amores não correspondidos que envenenaram suas vidas... Tudo isto está aqui, preso para sempre.Olhei para ela intrigado e um tanto intimidado, embora não soubesse exatamente o que estava falando. Fosse como fosse, era importante para ela. - Ninguém entende nada da vida enquanto não entender a morte - acrescentou Marina.

- Carlos Ruiz Zafón, in Marina.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Sobre os mistérios da alma

Marina me disse que a gente só se lembra do que nunca aconteceu. Ainda ia se passar uma eternidade antes que eu pudesse compreender essas palavras. (...) Na época não sabia que, cedo ou tarde, o oceano do tempo nos devolve as lembranças que enterramos nele. (...) Todos temos um segredo trancado a sete chaves no sótão da alma.

- Carlos Ruiz Zafón, in Marina, p. 7-8.

Primeiro ano sem você

Um ano sem você. E parece que foi ontem. Primeiro ano sem teu cheiro no ar a todas as minhas idas para casa. Primeiro ano sem doces de presente na Páscoa e em meu aniversário. Sem você me perguntar porque emagreci tanto, sem perguntar se estou doente, se preciso de algo, quando a faculdade vai acabar. Pois é, minha querida, acabou. Acabou a faculdade e não vais festejar comigo, não vais me acompanhar no baile de formatura, se orgulhar de tua única neta se formar. Não vais poder me chamar de "doutora" nem perguntar o que mesmo uma psicóloga faz. Foi-se este primeiro ano sem uma ligação no meu aniversário, sem uma xícara bonita de presente, sem dinheiro extra surgindo na minha poupança. Um ano sem você. Sem um nós, sem um a gente, um ano com um integrante a menos na família. Sem teus cabelos incrivelmente brancos, teus olhos verde-água iguais aos meus, teus sorrisos coloridos. Um ano que se vai - sem você. E de tudo que se vai, desta coleção imensa de perdas, fica a certeza de que onde quer que estejas, estás presente. No céu brilha a tua estrela. Hoje, eu tenho certeza. Continuo amando-a incomensuravelmente!

Crime e castigo

No dia em que completei 16 anos, descobri que tinha ódio de mim mesma e mal conseguia suportar minha imagem no espelho. Parei de comer. Meu corpo me causava nojo e tentava ocultá-lo sob roupas sujas e esfarrapadas. Um dia, encontrei uma velha lama de barbear no lixo e adquiri o hábito de me cortar nas mãos e nos braços. Para me castigar. Tatiana curava as feridas em silêncio, todas as noites.

- Carlos Ruiz Zafón, in Marina, p. 143.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Marés

Olha, eu desintegrei a Terra. Não, não chamei por ninguém enquanto trazia pedras novas. Também não dissera que faria sozinha. Ah, não. Não vieram. Ninguém. Era eu e o tempo, era eu e a velha vida, era eu e. Olha, não olha. Ouve. Sei de tudo o que sei que não sei. Somos tudo o que não pensamos. Somos as sombras, os galhos, os troncos inteiros. Desintegrei a Terra, mas esqueci de desgalhar as árvores. As raízes ficaram. Trarás gotas de água, terás orvalho na primavera, neve no inverno? Serás aquilo que nasceu para ser, fazer, crescer? Não, não sei a quem olhas. Mas não segues-me no vento - ele falha; não gritas pelas sombras - elas se transformam; não confias nas marés - elas desaguam. Em outros mares. E por fim restamos eu e tu. Tu e eu, e tudo o que eu queria dizer.

Sobre o futuro

"Eu podia ser a ternura
Sem desejo, beijo, nem sexo
Ser somente a história mais pura
Mas eu tô falando de amor".
 - Leoni, in Falando de Amor.

Talvez eu pudesse ser toda ou qualquer coisa, cujo único nome é incerteza.
Talvez eu buscasse as respostas em castelos de cartas, mas as cartas tenham sido edificadas à beira da janela - talvez haja vento, chuva, noite.
Talvez eu viesse a ser o mesmo e ser do mesmo é ser o mesmo que nada.
Talvez tenha cansado de perguntas gastas pelas certezas e queira algo para além do já conhecido.
Não, não estou falando de amor, mas também não falo de desistências.
Falo de tempo, de voz, de sonhos, de desejos - incertos, incompletos, funestos.
Desejos ainda não descobertos.
E eu, que dizia que encontraria por aí, segredos, talvez seja só poeira, conquista, saudade.
Ou seria eu o futuro, pássaro inseguro, arrastando as asas sobre o mundo?

domingo, 1 de dezembro de 2013

Bela confusão...

Você tem tido o melhor de ambos os mundos
És forte, mas carente
Humilde, mas gananciosa

Seus gritos cursivos tenho ouvido
Você tem estilo - é quieta, seletiva
No entanto tem uma mente um tanto imprudente
Bem, isso é apenas sugestivo
Isso é só o que a alegria é

Ei, que bonita confusão é essa?
É como catar lixo nas flores
Dói um pouco
Quando as palavra
Se transformam em facas

Suas voltas são rápidas
E provavelmente tem a ver com suas inseguranças
É como se nós estivéssemos lavando a roupa suja

Dói um pouco
Quando as palavras amáveis que você escreve
Se transformam em lâminas
Mas nós estamos aqui, querida
Nós continuamos aqui

É como adivinhar algo
Quando a única resposta que temos é sim
E através de palavras atemporais
E fotos de valor incalculável
Voaremos com pássaros que não são dessa terra

As marés mudam, os corações se desfiguram
Mas isso não é preocupação quando nos ferimos juntos
Nós rasgamos nossas vestes
E manchamos nossas camisas
Mas é bom por hoje
A espera foi tão válida.

Perdendo os sorrisos

O dia passou e você só fez burrada. A noite chegou e você tem que se admitir uma fracassada. Comeu demais, descontou toda frustração na comida, e depois a frustração da comida no seu corpo. Às vezes chora implorando para que algo mais sério aconteça e não tenha mais que suportar e sustentar tudo sozinha. Às vezes quase reza para que seja sério demais. Às vezes implora para voar para muito longe, para a esquecerem, para a deixarem partir, sumir, se esvaecer no ar. Às vezes, inclusive, tenta tudo isso. Não bastam lágrimas, o choro, o desespero entre quatro paredes. Vai até o banheiro, exita. Vai até o outro lado da rua, revida. Ciclos atrás de ciclos. Dores atrás de dores. Os sorrisos se foram, os medos tomaram conta, os olhares se perderam e nada foi posto no lugar. Tudo se perdera no ar.

Regresso

Ontem foi um dia esquisito... Precisei ir a um lugar perto de onde uma amiga que se mudou recentemente para o ES morava e passei em um mercado lá perto, que vende uns pãezinhos integrais que eu adoro e que nem sempre tem no mercado da rede aqui perto de casa e lá eu lembrei dela... Que a última vez que entrei lá foi com ela em um dia muito atípico... E bateu uuuuma saudade!
Eu nunca fui uma pessoa muito "social" então gosto de encontrar as pessoas por acaso, na rua, em lojas, no mercado. E como sempre morei em cidades pequenas, isso é fato comum. Isso me dá o "privilégio" de não ter que marcar uma visita, um encontro, um café, para encontrar com alguém. O que eu sei, é péssimo! Mas nos cinco minutos em que fiquei na fila da panificadora passou tanta coisa pela minha cabeça... Acho que só agora eu me dei conta de que de fato a faculdade acabou, eu sou uma psicóloga mesmo e estarei longe daqui em uma semana. Eu estou contente por estar voltando para casa por uns tempos, não quero que seja demais, um semestre no máximo, que é o tempo que eu espero conseguir entrar em um mestrado; quero passar um pouco mais de tempo com os meus pais, aproveitar eles, pois estão envelhecendo, assim como meu irmão, que eu amo tanto e não vi crescer. Mas ao mesmo tempo bateu um desespero, sabe? Parece que eu vou ter que começar tudo de novo... Conhecer as pessoas de novo, me conhecer de um jeito diferente agora, reaprender a viver em família, casa cheia, mesa farta, conversa jogada fora. É tudo tão oposto ao que foi minha vida nesses últimos cinco anos, em que eu fui tão sozinha, tão responsável, tão independente. E agora, que eu vou ter que encarar tantas mudanças? Será que vou saber lidar com o mercado de trabalho, família querendo saber o que estou fazendo, sorrisos rápidos não-convincentes e que não haverá mais um mundo só meu da porta do quarto para dentro?
Eu não sei bem o que estou sentindo, acho que são coisas demais, e por isso está tão misturado que parece um vazio. E no meio disso tudo eu me pego dizendo que estou com medo do regresso, medo do retorno ao ninho, nem que seja por pouco tempo, medo de idealizar coisas demais e acabar muito frustrada.
Escrevi tudo isso para contar para essa amiga da qual lembrei... Talvez pelo simples fato de que eu queria compartilhar com uma amiga o que estou pensando e sentindo - e porque estou me sentindo tão sozinha também...

sábado, 30 de novembro de 2013

Sobre a (des)ilusão

Como aquelas lágrimas de vidro, agrupadas sem lógica, e contudo tão sólidas que um golpe de martelo sobre sua parte espessa não as despedaçaria, mas que caem em uma súbita e impalpável poeira quando se parte sua extremidade mais fina que a ponta de uma agulha, tudo desvanecera!

- Villiers de L'Isle-Adam, in Verà, p. 98.

Sobre a simbose dos corpos

Os dias, as noites, as semanas voaram. Nem um nem outro sabia o que realizavam. E fenômenos singulares ocorriam agora, nos quais se tornava difícil distinguir o ponto em que o imaginário e o real eram idênticos. Uma presença ondulava no ar: uma forma esforçava-se para transparecer, para se tramar no espaço que se tornou indefinível.

- Villiers de L'Isle-Adam, in Verà, p. 91.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Sobre a brevidade da existência

 - Mas a beleza é breve, não é?  - refleti.
 - Como se mede algo assim? - Lorenzo ponderou. - Um verão que vale a pena ser vivido é longo para a borboleta. Mas nós queremos décadas. Entretanto, de que valem se estamos empilhando perdas sobre perdas? Preferiria contar dias do que anos. Cada dia um ano, pela conta da borboleta. - Ele riu de seu filosofar. - Ouvi dizer também que as borboletas vêm da boca dos anjos.

 -  Regina O'Melveny, in O livro da Loucura e das Curas, p. 267-8.

Sobre a busca (interna)

Se meu pai estivesse morto, eu haveria  de alcançar seu túmulo. Eu haveria de alcançar seu fantasma, se acreditasse nessas coisas. (...) Um a um fui ticando os países vazios da presença de meu pai. Entretanto, eu agora possuia seus óculos, seus sapatos e a descrição de um homem se desintegrando em Edimburgo. Ou talvez, seja eu a me desintegrar?

 - Regina O'Melveny, in O livro da Loucura e das Curas, p. 249.

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

About the silence

I don't want to be the girl who has to fill the silence
The quiet scares me 'cause it screams the truth!

 - Pink, in Sober.

Oh, no, no, no...

domingo, 24 de novembro de 2013

Depois da curva, ali.

Então deixo esse vento passar, e com ele vai o furacão que passava aqui dentro. Passa, passa longe, para lá da curva. Sobe a serra e desce correndo o monte. Por hoje é só. Deixo (só) passar a tempestade.
Céu negro, sem estrelas.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Aquilo que te digo entre os lábios

Olha, olha nos meus olhos. Não, desculpa, melhor que você não olhe. Não, não olhe porque há coisas que eu não consigo dizer se for olhando nesse teu brilho castanho, nessa tua verdade leve e brilhante. Não, não é que esteja nervosa, apenas não queria precisar dizer essas coisas, mas eu preciso. Eu preciso porque, sabe? A gente tem algumas coisas juntos, algumas coisas que eu queria dizer, mas que eu não estou certa de se posso, se devo. Não, não é porque não estou certa, é porque não queria ter que dizer para você. Olha, o céu está tão lindo lá fora, e a gente aqui dentro. Podemos dar uma volta enquanto conversamos. É que eu me sinto melhor se for lá fora. Não porque eu vou sair correndo e te deixar sozinho, não. É porque eu preciso respirar entre cada palavra, porque eu preciso me colocar em cada palavra e se eu não puder respirar eu não consigo te dizer tudo isso que eu quero, sabe? Não, não vai embora. É cedo. Não, eu sei que é tarde, mas eu queria que ficasse mais um pouquinho, porque. Hã? Não, nada. Eu te levo até a porta.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Sobre a (in)dependência no processo terapêutico

Moro há cinco anos na cidade em que estou e permaneci aqui por conta da Universidade. Destes 5 anos, fiz terapia em três deles, com duas psicólogas diferentes. Agora, estou no momento da terapia em que não preciso mais de sessões semanais, estou mais independente. Muito porque tenho apresentado um quadro de grande de avanço, embora com pequenos tropeços e recaídas pelo caminho - uma vida bem montanha russa, como na realidade é a nossa existência - mas também porque o ano está acabando, a faculdade também, e em menos de um mês eu estarei em outra cidade bastante longe da minha psicóloga. Não vou buscar outra (acho que ela me ofereceu tudo o que eu precisava), pois sinto que é o momento em que eu preciso me virar sozinha e também porque não sei ainda se vou ficar de fato na cidade dos meus pais. Mas acho que estou preparada agora para uma nutricionista e talvez seja este meu investimento das férias, além de me matricular em uma academia lá e não dar tempo de ficar surtando ou achando que não estou fazendo o suficiente.
A anorexia nunca me pegou para valer e embora eu tenha perdido bastante peso em pouco tempo neste ano, por eu ser gordinha meu IMC se manteve no índice saudável. Ainda assim, hoje estou no meu menor peso com a altura que tenho e o mesmo de 9 anos atrás, quando eu tinha 12. Mas ainda assim é saudável e o melhor, eu estou comendo sem tanta seletividade, como foi a minha vida toda, embora não tenha aberto mão de ser vegetariana (isso acho que eu não abro mão). Faço exercício físico todo dia, às vezes é o T. A. gritando no meu ouvido, mas em geral, quase todos os dias é pelo puro prazer de liberar o restinho de energia que ficou comigo lá no final do dia. Estou pensando seriamente em investir em uma maratona séria no próximo ano... Preciso treinar mais, mas estou bem a fim mesmo, me sinto quase totalmente preparada para isto.
Então é isso... Acho e tenho sentido ser assim, que a gente fica muito mais leve quando deixa de lado a importância que sempre atribuiu ao fato de estar ou não estar gorda, os medos de não ser aceita, a insegurança acerca de si mesmo... A gente começa a perceber que é excelente como é. E que isto é o suficiente!
E que no meio disso tudo, nossas psicólogas/os foram essenciais, mas a Clínica não é a nossa vida e há tanta coisa lá fora... Assim, eu digo para mim o mesmo que tenho dito aos meus pacientes da Clínica Escola nesse finzinho de ano (estou me formando em Psicologia), que o processo foi excelente e que já somos capazes de produzi-lo lá fora!

domingo, 17 de novembro de 2013

Sobre as incertezas da vida

Ela tem muita dúvida como todos têm. Mas nem todos sabem a beleza de saber lidar com a tristeza. Ela sabe. Ela ouve a música que seu coração pede e modela seu ritmo ao seu estado de espírito. Ela dança a coreografia de seus sentimentos, e todos podem ver. (…) Ela é mais que um sorriso tímido de canto de boca, dos que você sabe que ela soube o que você quis dizer. Ela fala com o coração e sabe que o amor, não é qualquer um que consegue ter. Ela é a sensibilidade de alguém que não entende o que veio fazer nessa vida, mas vive.

 - Caio Fernando Abreu

sábado, 16 de novembro de 2013

Sobre coisas que não podem ser ditas


Olha, antes do ônibus partir eu tenho uma porção de coisas pra te dizer, dessas coisas assim que não se dizem costumeiramente, sabe, dessas coisas tão difíceis de serem ditas que geralmente ficam caladas, porque nunca se sabe nem como serão ditas nem como serão ouvidas, compreende?
(...) Não me entenda mal, mas é que a gente tem tanto medo de penetrar naquilo que não sabe se terá coragem de viver, no mais fundo (...) mas nunca, em nenhum momento, essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as janelas, e depois as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente, você não cresceria se eu a mantivesse presa num pequeno vaso, eu compreendi a tempo que você precisava de muito espaço.

- Caio Fernando Abreu, in Para uma avenca partindo.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

A melhor sensação do mundo?



Ah, a melhor sensação do mundo é ir dormir com a consciência limpa, com a certeza de que o melhor foi feito neste dia, e que o melhor é só o suficiente. A melhor sensação é aquela que se sente depois de uma hora de corrida, respiração acelerada, ombros suados, para gastar o último tiquinho de energia do dia. Ou talvez seja olhar as estrelas em um céu negro-azulado em uma noite quente de novembro. A melhor sensação do mundo é se olhar no espelho, os olhos, a barriga, as costas, as coxas, os seios; e poder dizer a si mesma com convicção que não há nada errado com seu corpo. E acreditar nisto. Ou então, a melhor sensação do mundo seria correr na areia descalça, jogando frescobol ao entardecer. Ficar ruborizada e muda diante de algo que não queria dizer. A melhor sensação do mundo é a plena certeza, é a inevitável conquista, é o resultado perfeito. É saborear melancia geladinha, fofocar com a vizinha, rir a toa e fácil. A melhor sensação do mundo é fazer sentido. Mas se nada disso fizer sentido para você, tudo bem. Só, me conta, então, qual a melhor sensação do mundo para você?

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Sobre o sofrimento e a dor

"Para que serve o sofrimento?, ele costumava perguntar em momentos de inquietação. "É para que as pessoas se apoiem mutuamente", disse certa vez, quando eu tinha dez anos. Saber que não estamos sozinhos pode nos trazer a calma e a afeição que consegue unir estranhos.

- Regina O'Melveny, in O livro da Loucura e das Curas, p. 59.

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Sobre a eternidade


Os campos na estrada para a Pádua cintilavam com painços maduros e um exército de cigarras perfurava o ar. Como a garotinha curiosa que fui, certa vez trouxera para meu pai a mão cheia de cascas de cigarras cindidas com perfeição e perguntei o que acontecera com os corpos rachados no auge do verão. Elas se transformaram em pequenos espíritos chamuscados? Os espíritos, então aqueceriam o céu? Meu pai sorrira com aquelas perguntas. Gabriella, ele brincou, elas cantam até rachar.

- Regina O’Melveny, in O livro da Loucura e das Curas, p. 47.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

O que ninguém conta sobre fazer dieta



Que perder peso autoriza um biquine menor, uma tarde na piscina, saia curta, vestido justo, brigadeiro no final de semana e etc, etc, todo mundo sabe. Mas quero falar sobre as coisas obscuras sobre fazer dieta, aquelas que ninguém conta, que ninguém comenta.
Por exemplo, ninguém me falou que emagrecendo 15 quilos, obviamente, por consequência minhas calças não me serviriam mais e ficariam feias em meu corpo se as vestisse. Ninguém disse que renovar um guarda roupa inteirinho custa muuuuuito caro para quem não tem hábito de fazer isto. Então, ontem, peguei minhas cinco calças jeans mais bonitas, novas e de marca, e as ofereci em um brechó, para ver se eu conseguia alguma coisa com elas e o quão espantosa não fiquei ao perceber que minhas cinco calças jeans (caras!) não seriam compradas por um valor suficiente para eu comprar nem uma calça nova da mesma marca – mesmo que quatro tamanhos menor.
Tudo bem, comecei pelo mais fútil, dirão os leitores, mas as roupas a serem usadas também são importantes, afinal não dá pra ficar pedindo roupa emprestada para as amigas o tempo todo, não é?
No entanto, tem outra coisa que incomoda muito mais do que as calças jeans grandes demais que nem pregas resolvem... Todos aqueles que me incentivavam na dieta, mesmo que não de forma direta, não falaram nada sobre a baixíssima tolerância ao frio que eu teria. Vivo com frio, o tempo todo. As mãos roxas como de morta, queixo batendo, braços e pernas arrepiadas. Ninguém falou sobre os blusões no verão e que duas cuias de tererê gelado me exigiriam colocar um par de meias. Ninguém falou. Disso ninguém fala.
Ninguém falou também que pessoas que fazem dieta não querem ser MAGRAS, mas EMAGRECER. Mais e mais e mais. E aí, claro que você começa a se olhar nos espelhos e parece que seu braço está imenso, as coxas gigantescas, mas na verdade é só pele flácida, afinal foram gorduras e músculos que o organismo sumiu em alguns meses. Mas o espaço pertencente a eles ficou. Embora agora, tudo flácido.
Então, quero dizer o quê? Que tudo isso tem muito pouco a ver com IMC, taxas de colesterol, etc. Tem muito a ver com uma insatisfação gigantesca, muitas vezes proporcional ao excesso de peso (se é que ele existe mesmo), dentro do coração. E nessa lógica, hoje, sou uma pessoa menor, mas com os mesmos problemas – ou, diria mais, com problemas ainda maiores, porque a bulimia passou a me acompanhar a cada ida a um jantar ou uma festa, a cada pedaço de bolo recheado de cenoura em que a irmã anorexia gritava na minha orelha “você não pode fazer isto”. No final das contas, sou uma pessoa muito maior e mais cheia de problemas.
Então, talvez seja a hora de perguntar às pessoas que nos incentivam nas dietas dizendo “nossa, como você está linda” e equiparando linda a magra, ou “não vá engordar tudo de novo”, etc. etc., se elas podem falar também sobre as outras coisas pelas quais passam as pessoas que fazem dieta. E também nos permitir avaliar, em nome da felicidade, se precisamos mesmo de uma dieta e sob quais condições.
Para que seu mundo não vire um “inferno diet”, pergunte-se sobre o que há por trás da sua dieta.