Sair
de casa e viajar. Viajar, viajar muito. “Eu quero conhecer o Cristo”. Porque
queria mesmo ver o Cristo Redentor, o Rio de Janeiro... Ah, o Rio de Janeiro.
Terra de areia, gotas de mar nos cabelos, o sol na face trazia a brisa do mar. “Não,
não andei tudo isto para não entrar”. Oxalá os pés aguentassem correr mais, mas
bolhas grudam nos sapatos. O mendigo espancado no Porto do Rio talvez merecesse
meus sapatos: eles não me machucariam mais e eu teria feito uma boa ação. Mas
que ação seria maior do que se tivesse lhe ajudado? Pedi para não baterem, mas
ouvi um não e diante do não, eu recuei. Recuei como cachorro vira lata que come
carne podre do chão. Eram mil, eram um milhão. Como em um sonho, milhões de crianças
de rua choravam e me pediam comida. Mas eu não tinha. A história era triste,
mas não inventada. Talvez fosse retalhada, desavisada, inconformada; mas nunca
inventada. E eu queria dar a cada um deles um pedaço de meu sanduíche natural
integral. Não! Um copo de coca-cola com vodka, porque na noite fria e úmida, prostituição
poderia levar à euforia e nunca diriam que não. Amor de mãe? Tesão de pai?
Nunca sonharam com um carinho despretensioso, aquelas crianças. Des-pretender o
quê?! Se o fim lhes viesse, era o fim também para mim que os observava sem
querer observar. Olhos fechados, a baba escorrendo no queixo e pelo
travesseiro. Morte ou Amor? Fodam-se as linhas tortas, dane-se o choro
engolido. Se te amei foi por um copo de vodka e um pouco de vinho branco suave,
por favor. Como pular de um muro no alto do Cristo Redentor e gritar, até
acabar, até me acabar. No limite do horizonte, ali eu também, caindo livre.
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