segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Desenhar a dor


Sigo pensando em uma imagem que eu disse há alguns dias, sobre “a qualquer momento a vida se desprender”. E, dessa imagem, me veio outra imagem nesse final de semana. Eu estava a fim de desenhar, e isso tem sido bem difícil de acontecer nos últimos tempos de tanto “trabalho sério”, mas resolvi terminar dois projetos de meses que havia começado. Eram promessas para amigas. Em algum momento o pensamento me escapou e quando voltou, me vi pegando todos os desenhos que eu fiz e tenho guardados e mandando por correios para pessoas, me desfazendo deles. Me desprendendo. É uma imagem bem poética, eu sei, talvez eu tenha querido deixar mais bonita que verdadeira, essa história. Porque a original não é tão bonita assim… Não tem despedidas, não tem cores e rabiscos enviados pelos correios, nem dá tempo de colocar a roupa mais confortável, o calçado que nos veste melhor, sabe? A versão original da história acaba com uma mensagem de “tô indo” e um remetente que nunca chega. Na história original tem roupas espalhadas pelo quarto, tem um computador ligado fazendo um upload, tem comida descongelando na pia para o almoço de alguém que não vai voltar. Você entende? Não tem como não ficar com essa imagem de “vida que se desprende”, porque a única coisa legítima da história encerra com a respiração acelerada, taquicardia, hipotensão e parada cardíaca. Bem menos poética. Nem um pouco bonita. E desenhar é a coisa mais bonita e que de melhor eu sei fazer com a dor. É a coisa mais bonita e mais sincera, é quando posso me colocar por inteira, nem que seja pra me colar naquele desenho e ir parar na parede de alguém.

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