“Não sei que nome tem, mas sei explicar. É esse sentimento que chega e invade, toma conta das minhas mãos, dos meus olhos, e de tudo o que eu penso”. E ele a beijou. Naquela noite, não tiraram os casacos. Chegaram da rua, caminharam entre o vento gelado exaustos, com as mãos geladas e o sangue fervendo, pulmões queimando. Seria um inverno rigoroso, a julgar pelas primeiras noites do outono. Mas se bastavam. Ela com seus olhos verdes brilhantes, ele com as mãos quentes e com suas calosidades. Os últimos meses exigiram muito de ambos, o dinheiro era pouco, os amigos em menor quantidade ainda. “São tempos difíceis para os sonhadores”, ele dissera certa noite. Ela se recusava a acreditar, mas sentia na pele e em seus ossos. Perdera muito peso no último mês, chegavam tarde e não havia nada para o jantar. Ele sabia que ela estava partindo, mas ainda assim queria protege-la. Jurou-lhe que a amaria até o fim, mas no fundo, egoísta, acreditava que seu fim seria antes do dela e agora tinha que aceitar a escrita confusa dos exames. Ela iria partir. Partiria, se não pudessem fazer alguma coisa, e na realidade nada havia a ser feito. A não ser esperar. E assim, esperaram. Passaram-se os dias, as semanas, os meses. Quase um ano se fora e ela ia partindo com eles. O brilho de seus olhos diminuía a cada dia, assim como seu bronzeado, que não voltara com o sol de verão. Ele passava o dia trabalhando, trazia seus remédios a noite, mas ela, deitada na cama, não resistia. Ela ia, como carros que passavam apressados pela frente do apartamento. Pouco a pouco ele percebia que existia sem ela e que, sem ela, seria sua existência em breve, mas se recusava a acreditar. Sempre deixava algumas lágrimas caírem na sopa, às vezes perdia a hora sentado olhando para sua imagem no espelho do banheiro. Como ela partiria?
Durante várias horas ele se imaginava sem ela, sempre que se deitava, para dormir. Tinha medo de tocá-la e quebra-la, tão frágil estava. Às vezes acordava assustado, próximo demais do rosto dela, da boca bem delineada que suspirava baixinho. Ele via, ela também chorava antes de dormir, mas nenhum dizia uma palavra ao outro. E assim foram seus últimos dias juntos: cada vez mais silêncio, cada dia mais calados. “Não se vá”, implorava baixinho, para que ela ouvisse, ou Deus, “sei lá”. Por quantos meses juntos ele daria sua vida? E se ela ficasse, o que mudaria naquela estória? Quando aquelas horas e dias de silêncio, iriam acabar?
Mais tarde, embora não muito, ela finalmente se fora. Em uma noite quente de verão, sem casacos, sem sopa, em silêncio. Respirara fundo e o deixara com uma rosa na mão, parado em pé na porta do quarto. “Olha, depois de tanto silêncio, eu queria dizer...”.