Me peguei dizendo que a vida é muito injusta. E disse isto
porque você se foi. Na tarde de hoje, nosso Giuliano se foi, e digo “nosso”,
porque você era de todo mundo, querido por todo mundo. Você que tinha esse
jeitinho deliciado todo seu de dizer “querida, tira esse vestido e taca fogo,
por favor!”, ou seu riso engraçado de no alto do seu 1m90 dizer que está tão
gordo que está saindo sangue do nariz de tão apertada que está a sua calça
jeans, você que tinha um jeitinho irônico e nada leviano de brincar com as
“sacanagens” que dizia ter feito com seus alunos. Mas talvez meu caro, e só
talvez, a vida não tenha sido injusta contigo, embora tenha sido curta, e só tu
saibas a dimensão disto. Eu sei que digo isso agora porque estou zangada e queria
que você estivesse conosco para terminar os artigos do projeto no ano que vem,
porque queria ter toda essa sua simpatia bailando pelo salão de meu baile de
formatura, porque queria mais uma vez ser convidada a fazer fragmentos célebres
de dramaturgos em suas aulas, porque queria que você terminasse a brilhante
tese do doutorado. Porque eu queria poder te contar que fui aprovada no
mestrado, dizer isso para você que torcia por mim! Eu sei que nunca mais
conseguirei ler Zizek da mesma forma depois deste dia e é incrível que no mesmo
momento em que recebi a notícia da sua morte estivesse com “Como ler Lacan”
aberto na tela do meu computador, lembrando daquela aula fantástica na
disciplina de Lacan neste ano. Por que não poderemos trocar figurinhas sobre
materialismo dialético enquanto estiver escrevendo minha dissertação? O que eu
faço com teu nome na lista de convidados do meu baile de formatura?
Ou talvez essas lágrimas sejam porque eu me dei conta só
agora, e me pergunto como seria se fosse comigo, de que a vida é frágil. De que
nosso corpo é uma taça de vidro fino, é um nada frágil, fraco, quebrável. E que
a gente sequer pode escolher ficar mais um pouco. Lembro que quando vi a
notícia de duas meninas que morreram no dia seguinte à apresentação do TCC,
aguardando ansiosas pela formatura, assim como eu, eu brinquei com as pessoas
dizendo que se eu morresse eu ia chegar para São Pedro e dizer “ah, não, São
Pedro, o senhor faça o favor de me deixar voltar até a minha formatura”! Mas eu
sei que não poderia escolher, que não estaria em minhas mãos e que, portanto,
eu também não poderia dizer adeus.
É profe, acho que você deixou marcas por aqui que não
poderão ser apagadas. E eu espero mesmo, do fundo do meu coração, que você
também acredite que a vida foi justa o suficiente contigo, mesmo tendo sido
curta. Ou melhor, que ela só tenha sido curta para nós, meu caro. Somente para
nós.
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