Te
vi indo embora. Tua silhueta larga e magra me abandonando na melhor hora. Pois
disse que nada de mim sairia a não ser umas noites bem malhadas na fina
corrente do grito. Que levaria tuas palavras e facas amaldiçoadas pela noite
adentro e deixaria do lado de fora. Do lado de fora, sim, da casa, da porta, do
carro, da hora. Fora do tempo que queima a memória que leva uma mulher a chegar
perto de um homem e queimar, queimar até fim. Tocar nesse teu corpo quente,
ardente como flores de fênix esperando a brasa cessar. Virar poeira e ao mesmo
tempo gelo, gelo seco que sem delongas avança no ar. Virar água morna e
salgada. Lágrima que escorre da parede de templos em dias de sol. Escorrendo
vivas e inteiras, grandes, traiçoeiras, escorrendo pelos dedos da mão. Essa tua
mão que me toca e esbofeteia. Mas caio. Firme como a noite, flácido como o dia.
Caio e escorro pelo ralo que fede pútrido na beira do asfalto. Na rua do beco.
Escorro. Escorro como escorrem tuas palavras e tua vida, como escorrem teu
sangue e teu lamento. Escorro como baba de cão sarnento. Escorro e corro pelas
pontas dos teus dedos.
(...) Já vistes o último brilho nos olhos de alguém? Eu já. Na noite passada.
- T. B., In Escorrendo pelos dedos.
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